Com dificuldades para acessarem à medicação abortiva, brasileiras ainda enfrentam riscos para um aborto seguro
A pílula abortiva é considerada uma alternativa segura para a realização do aborto em diversos países. Entretanto, no Brasil, a proibição de tal medicamento ainda é uma das mais rigorosas. Comercializado no país com o nome de Cytotec, o misoprostol, teve seu acesso dificultado e a comercialização proibida ao longo dos anos.
Proibição do Cytotec nas farmácias
A história do misoprostol no Brasil evidencia o controle que o Estado tenta exercer em relação ao corpo da mulher. Com o aborto ilegal desde 1890, a descoberta do medicamento, em 1980, foi uma alternativa para que as mulheres exercessem sua autonomia sobre a escolha reprodutiva, já que em pouco tempo foi identificado que a medicação utilizada para tratar úlcera provocava a menstruação em casos de gravidez.
Entretanto, a pílula passou a ser vendida em farmácias apenas com receita médica, o que já dificultou o acesso à alternativa para as mulheres a partir de 1991. Mesmo com avanços políticos e medicinais, as brasileiras sempre estiveram à mercê da criminalização e do moralismo em relação ao aborto.
Em 1940, a legislação incorporou a excessão quanto à proibição do aborto em casos de gravidez em decorrência de estupro, ou quando a gravidez coloca a vida da mulher em risco. Porém, o misoprostol foi incluído na lista de medicações controladas em 1998, fazendo com que as farmacêuticas parassem de produzir no país, já que o porte e comercialização passou a ser passível de pena.
Mesmo com o acesso à pílula restrito a hospitais e clínicas médicas, a alternativa de mulheres que buscavam a medicação para um aborto seguro ainda era a compra de forma clandestina. Mas, ao longo dos anos, a lei foi impedindo mais e mais esta via del acesso. Em 2006, por exemplo, foi proibida a venda e comercialização da pílula pela internet.
A busca clandestina pela medicação
Neste cenário, não é difícil encontrar histórias de mulheres que se colocaram em risco em busca de uma solução. A proibição da medicação viabilizou que o tráfico dominasse as vendas ilegais. A insegurança e o risco de não saber se a medicação encontrada é segura ou não é o que aumenta ainda mais a vulnerabilidade de quem busca um aborto por pílulas no Brasil, mesmo este sendo o método mais seguro atualmente.
Com a proibição de falar sobre o tema na internet, as brasileiras tentavam driblar as leis e buscar apoio em instituições e ONGs internacionais que prestam suporte. Entretanto, durante o governo Bolsonaro, o acesso ao misoprostol ficou ainda mais difícil. Até mesmo serviços de saúde formais passaram a encontrar obstáculos para realizar atendimentos à distância durante o período da pandemia de covid-19 em casos de abortos legalizados.
Diante desta realidade, é fácil se deparar com a angústia e nervosismo de mulheres que torcem para encontrar medicamentos verdadeiros no mercado clandestino ou no tráfico. E, ainda assim, mesmo quando elas encontram possíveis contatos e traficantes, existe o medo de precisar de atendimento médico após o aborto ou então do procedimento não funcionar.
Uma pesquisa de mestrado desenvolvida por Anne Karoline Borges Silva da Universidade Federal de Minas Gerais em 2018, indica que as mulheres gastavam por volta de 400 e 1200 reais na época. Mas, além da barreira financeira para viabilizar um possível aborto, existe também um fator social sobre o acesso de informação e detenção de contatos, redes e acesso a conteúdos sobre como realizar um aborto e onde encontrar a medicação.
Todo o processo para realizar um aborto a partir das pílulas ainda é um caminho tortuoso para as brasileiras que tentam driblar a lei, mas sabem que a medicação é a alternativa mais segura ainda hoje.
Uma medicação segura e eficaz
Apesar das barreiras e entraves legais para acessar a medicação abortiva, o misoprostol ainda é a solução para o combate da mortalidade de mulheres. No Brasil, as clínicas clandestinas ainda atendem quem buscam uma solução eficaz, mas não têm informação ou acesso suficiente para acessar o Cytotec.
Ao contrário das clínicas, que não têm fiscalização e um procedimento assegurado pelas principais organizações de saúde do país, o misoprostol continua sendo a medicação utilizada pelo sistema de saúde nacional em casos de aborto legais. De acordo com um estudo publicado no The Lancet, apenas 4% das mulheres que usam o misoprostol para interromper a gravidez necessitaram de intervenção médica posterior, e cerca de 1% tiveram algum tipo de complicação.
Apesar do caminho incerto para encontrar pílulas verdadeiras do medicamento, as mulheres brasileiras ainda seguem caladas sobre suas tentativas de abordo, realizando procedimento por debaixo dos panos. O medo da criminalização e do julgamento dificulta que o tema seja discutido sobre os holofotes necessários para alcançar uma saúde pública digna que respeite a autonomia das mulheres.
Para saber mais sobre como realizar o uso de pílulas abortivas da forma correta, acesse as instruções do How To Use Abortion Pill ou converse com Ally, a chatbot de aborto seguro.